CINEFEM DISCUTE AS PRESSÕES QUE ADOECEM AS MULHERES A PARTIR DE CISNE NEGRO
segunda-feira, 06/10/25 13:12
Autocobrança, pressão social, rivalidade feminina, abuso sexual e conflitos familiares foram alguns dos temas debatidos na edição especial do CineFem – Cinema e Piano, realizada na quinta-feira, 2 de outubro, no Centro Cultural IDEA. O encontro, promovido pelo Núcleo das Mulheres (NM) do SINJUS-MG, trouxe para discussão o filme Cisne Negro, dirigido por Darren Aronofsky. A escolha dialogou diretamente com a campanha Setembro Amarelo, já que o longa instiga reflexões sobre os desafios da saúde mental e seus impactos no cotidiano.
Guiadas pela psicanalista Luciana Mori e pelo doutor em Cinema e idealizador do projeto Cinema + Piano, Anderson Ribeiro, as participantes mergulharam em uma análise sensível do enredo do filme. A conversa destacou como os recursos cinematográficos ampliam o impacto emocional da obra e revelam suas múltiplas camadas. A participação do pianista Ighor Bastos, que interpretou ao vivo músicas da trilha sonora, contribuiu para tornar o momento ainda mais envolvente.
“A escolha de Cisne Negro para essa edição foi muito acertada. Ao reunir mulheres e música em um espaço acolhedor, o CineFem cria o ambiente perfeito para que assuntos delicados como esse possam ser compartilhados com leveza e sensibilidade”, analisa a coordenadora do NM e diretora administrativa do SINJUS, Adriana Teodoro.
Imagens e sentidos
Cisne Negro acompanha a trajetória de Nina, uma jovem bailarina obcecada pela perfeição. Dedicada e disciplinada, ela conquista o papel principal na montagem de O Lago dos Cisnes, mas sua busca pela excelência a leva ao limite. Um dos aspectos centrais da narrativa é a relação de Nina com a mãe, Erica, uma ex-bailarina frustrada que projeta na filha a carreira que não pode ter. Na trama, a mãe é, ao mesmo tempo, uma figura de cuidado, proteção, controle e opressão, mantendo Nina presa a um estado de infantilização que impede sua autonomia. O quarto repleto de bichos de pelúcia, as roupas delicadas e a chantagem emocional revelam uma relação sufocante.
Na análise dos especialistas que participaram do CineFem, isso fica visível pelo cenário que aposta em corredores e ambientes estreitos, bastidores escuros e no uso da câmera próxima e claustrofóbica na maioria das cenas, transmitindo ansiedade, paranóia e a sensação de perseguição. A presença de espelhos e reflexos criam uma atmosfera de vigilância e aprisionamento psicológico, além de ilustrarem o conflito interno da personagem, a perda de identidade e a dualidade entre “eu” e “outro”. As cores também funcionam como um recurso narrativo e psicológico. A transição de tons claros para tons cada vez mais escuros acompanha a metamorfose de Nina ao longo do filme.
“O CineFem também desperta um novo olhar sobre o cinema. É interessante aprender mais sobre os recursos usados nos filmes, porque passamos a perceber melhor os detalhes e como eles comunicam emoções e mensagens. Saímos do evento não só tocadas pelo conteúdo, mas também mais atentas à arte”, conta Janaina Torres, coordenadora do Núcleo das Mulheres e diretora de Aposentados e Pensionistas do SINJUS.
Machismo estrutural
Cisne Negro também propõe uma reflexão sob a ótica do feminismo, ao mostrar como as mulheres são moldadas, controladas e frequentemente levadas ao limite na tentativa de corresponder a padrões inalcançáveis de beleza e, muitas vezes, contraditórios, que exigem delas, ao mesmo tempo, pureza e sensualidade.
Um dos exemplos mais evidentes dessa dinâmica é a relação do diretor artístico Thomas com Nina e Beth, marcada por poder, controle e sexualização. Thomas utiliza sua posição de autoridade para manipular e objetificar as bailarinas, confundindo orientação profissional com assédio e abuso emocional. Com Nina, ele estimula a sensualidade sob o pretexto de aprimorar sua performance, reproduzindo o papel do homem que “molda” a mulher segundo seu ideal. Já Beth representa o “descarte” da mulher que envelhece e perde o valor dentro de uma lógica patriarcal que associa o feminino à juventude e à aparência.
“É impossível não se reconhecer em alguma parte da história. Muitos dos temas abordados no filme fazem parte do nosso cotidiano. Por isso, sempre participo do CineFem e incentivo as colegas a virem também. Debater em grupo faz muito bem”, afirma a servidora Maria de Fátima Gonçalves.
A rivalidade feminina também aparece no filme, de formas distintas nas relações de Nina com a mãe e com Lily. Essa rivalidade é resultado de um contexto de dominação e comparação constante, em que as mulheres são levadas a competir entre si. Ao tentar corresponder às expectativas e “superar” as outras mulheres, Nina acaba se perdendo: sua vitória é, ao mesmo tempo, a perda da própria identidade.
“Ainda há muito estigma em torno do suicídio e da saúde mental, mas, com diálogo, apoio e espaços como o CineFem, especialmente entre mulheres, é possível refletir, buscar ajuda e encorajar outras pessoas a fazerem o mesmo. A arte contribui muito nesse processo. Um filme como este, somado às explicações e ao debate, desperta reflexões profundas e pode ser o ponto de partida para transformações importantes”, destaca a servidora Janaina Terra.
Participe!
O CineFem é uma iniciativa que busca promover o debate e a reflexão sobre temas sociais e políticos por meio do cinema, proporcionando um espaço de troca e aprendizado para as servidoras do TJMG e do TJMMG. A cada edição, um filme é escolhido para estimular discussões que ampliam o olhar sobre questões essenciais para a sociedade. Fique atenta às mídias sociais do SINJUS e participe do próximo encontro!