O paradoxo do brasileiro

quarta-feira, 31/10/12 11:00

Por José Moreira Magalhães

Tem sido frequente, nesses dias bicudos por que passa nossa política, ouvir-se pelas esquinas e rodas da vida "que o julgamento do mensalão é um paradigma" – "que o Brasil não será mais o mesmo". Não creio.
 
Estou com Jânio de Freitas: a degradação da ética e do nível cultural na política não se altera com episódios circunscritos como esse. Dizem que o Lula está triste, acabrunhado. Dos oito ministros do Supremo indicados pelo PT só dois absolveram João Paulo Cunha. Sentiu-se traído. Sua “a-moralidade”, quando separa política e ética, como fez Maquiavel em "O Príncipe", não tem limites.
 
Ao contrário, seu caldo engrossa à medida que vai acrescentando ingredientes de uma receita conhecida: a ânsia pela perpetuação no poder a quaisquer meios; a ditadura do partido único; o fisiologismo dos grotões, a barganhar nacos do poder pelo País afora e às escondidas; o estelionato eleitoral, aplicado sobre a massa informe dos bolsistas-família. 
 
Há quem se lembre do João Paulo Cunha na Pastoral da Juventude, em Osasco, tempos heróicos, quando entronizava a ética no altar da política. Lula cooptou a todos. Do bom moço da Pastoral, João Paulo tornou-se mais um sujo explícito desse tempo de poder.
 
Até dezembro próximo, mais dois ministros do Supremo se aposentam: Ayres Britto e Celso de Mello. Joaquim Barbosa, o próximo Presidente, já se adiantou. Quer ter uma conversa com a Dilma. O tema? Como se nomeiam ministros para a Suprema Corte do País. Fala em preparar-lhe uma lista com sugestões de nomes impolutos da magistratura brasileira.
 
Li ontem que o PT também já se movimenta. De Lula a Tarso Genro, incluindo José Dirceu.
Vou anotar alguns nomes, para checar depois: Ali Mazloum, juiz federal; José Eduardo Cardoso, Ministro da Justiça; Luís Inácio Adams, da AGU; Maria Elizabeth Rocha, a preferida do Dirceu.
 
Faz parte da lógica. Sem aparelhar os principais postos, por onde corre o caldo da corrupção, do favorecimento, do desvio de dinheiro, do nepotismo cruzado etc., não há como perpetuar o poder. Simples assim. Mas é muito deboche querer expandir essa prática para a Suprema Corte.
 
Qual o problema de fundo? A degradação ética e política. Governos e órgãos que se montam com o objetivo primeiro da gatunagem. O povo passa ao largo, vivendo suas agruras diárias, pela péssima qualidade dos serviços que lhe são ofertados, para qualquer lado que se olhe. Um país, sem projeto de país. Um povo sem governo, inculto e que não se organiza para a mudança não pode ser um povo de bons augúrios.
 
Viram a última? 13,7 mil litros de plasma sanguíneo, 55 mil bolsas, escondidos em um depósito dentro do Ministério da Saúde, com validade vencida há cinco anos. O Ministério Público está investigando. Dizem tratar-se de esquema de corrupção com braços no fornecedor da França, a LFB. Humberto Costa, Temporão e Padilha já se apressaram a dizer que de nada sabiam. Não tanto pelo dinheiro público, mas pela não produção dos fatores 8 e 9 para os hemofílicos e da imunoglobina e albumina, de uso cirúrgico.
 
Em seu "Vícios Privados, Benefícios Públicos?", Eduardo Giannetti fala do assim chamado "paradoxo do brasileiro". Um paradoxo é uma provocação à lógica, em que , o que é dito, nega o que se diz.
 
No caso, é difícil encontrar um brasileiro que não clame por mais ética e mais justiça. É difícil encontrar alguém que não esteja apreensivo e desapontado com o que se passa hoje em nosso País. Isoladamente, temos o sentimento sincero de estarmos acima de toda a podridão que está aí. Nenhum de nós, no íntimo, compactua com o mar de lama, o escárnio e a desfaçatez de nossa vida pública.
 
O paradoxo aparece quando, no entanto, sabemos que tudo isso que está aí é o resultado de todos nós juntos. Sonhamos, cada um em sua ilha, mas vamos tropeçando coletivamente. A soma de nossas partes é menor do que nosso todo. Giannetti conclui: em breve estaremos reduzidos a duas classes fundamentais, a dos que não comem e a dos que não dormem.
 
Qual a explicação para o paradoxo? 
Não é só a hipocrisia: alimentar uma auto-imagem valorosa e compactuar com o tropeço coletivo. Talvez o núcleo explicativo seja mais ético ou de auto-engano. Olhar para nós mesmos e não perceber que o Brasil está dentro de nós. Mentir para nós mesmos.
 
O contrário disso não é o que se sente entre os desenvolvidos? Vejam os franceses, ao longo de sua história. Lembro-me de uma piada que contava o Padre Olegário, meu professor em Mariana. Perguntado, na Alemanha, se no Brasil havia índio que comia gente, ele respondeu: só tinha um, meu pai comeu. Sem comportamento ético, individual e coletivo, sem um agir responsável, não sairemos do lugar.

A figura ilustrativa é de Grande Otelo, em Macunaíma, de Joaquim Pedro de Andrade, o índio-herói-sem-caráter, que, segundo Mário de Andrade, é o povo brasileiro.
Até breve.
 

 

José Moreira Magalhães

É economista, com especialização em Planejamento Governamental; consultor em orçamento e finanças; e fiscal de tributos estaduais. Foi diretor de arrecadação, diretor do Tesouro Estadual e Diretor Financeiro do TJMG. Autor do livro "Desvendando as Finanças Públicas".

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